A virada do ciclo

Entenda os dados e conheça as análises atuais do mercado de escritórios.

Fernando Didziakas – Sócio Diretor da Buildings

Na edição mais recente do Buildings Exclusive, que aconteceu em novembro de 2019, comecei a apresentação dos dados do setor de escritórios falando sobre o bom momento para os proprietários e relembrando o último ciclo de 10 anos, que certamente foi sofrido para muitos deles. Minha primeira análise teve como base o mercado de São Paulo: no ultimo ciclo de 10 anos, de 2009 até 2019, tivemos cinco anos de queda de taxa de vacância, de 2009 até 2014, e cinco anos de elevação, sendo que agora temos um novo momento de queda. Mas esses fatos são conhecidos e os maus momentos foram superados com maestria pelos principais players.

Não podemos deixar de observar todo aprendizado e aprimoramento que ocorreu neste período: hoje, temos um mercado muito mais maduro e que tende a sofrer bem menos no próximo ciclo de 10 anos. Veja: há 10 anos, já tínhamos muitas das tecnologias que temos hoje, mas elas não eram bem exploradas e direcionadas para o nosso setor. Nesse período, o mercado imobiliário corporativo ou a utilizar mais (e de melhor forma) a internet e a coletar e utilizar mais dados. Isso aconteceu por meio do desenvolvimento de plataformas de inteligência, como é o caso da Buildings, até mesmo por meio do lançamento do CRE Tool, em 2012.

Além da maior exploração da tecnologia, notamos que o setor – a partir de certo ponto – ou a acompanhar a evolução tecnológica. Um dos principais exemplos é o Buildings Mobile, aplicativo da Buildigns que está de acordo com a postura de termos tudo à mão, em qualquer momento, por meio do notável avanço da tecnologia em smartphones e tablets.

Mercado carioca

Na cidade do Rio de Janeiro, temos sinais de melhorias, que já são apontados há certo tempo. Antes de abordar propriamente esses detalhes, é importante entendermos o cenário macro da cidade: são 671 edifícios corporate que somam 5.5 milhões de metros quadrados e estão com pouco mais de 22% de taxa de vacância, segundo os resultados da pesquisa Buildings referente ao quarto trimestre de 2019. Separando os empreendimentos classe A, são 132 edifícios, em 1.8 milhões de metros quadrados e 38,31% de taxa de vacância.

O primeiro indicador que precisamos analisar é a taxa de vacância: em 2017 – separando somente os empreendimentos classe A – tivemos um pico perto de 50%. Contudo, desde então, o indicador segue em queda, ainda que não muito acentuada. Somada a essa queda, podemos considerar uma melhoria do mercado também devido à absorção líquida. Nesta análise, é preciso entender que, historicamente, a cidade sofreu bastante com devoluções nos anos anteriores, sobretudo das áreas que eram ocupadas pela Petrobras e por No primeiro semestre de 2019, a cidade chegou à marca de 53.792 metros quadrados de absorção bruta, sendo que no ultimo trimestre de 2019 esse número ficou em 42.832 metros quadrados. São números bons para a cidade o momento e podemos dizer isso com base, por exemplo, nos 203.190 metros quadrados de absorção líquida dos últimos três anos, número próximo ao que a São Paulo registra no período de um ano.

Para entender mais alguns detalhes sobre o mercado da cidade, fizemos algumas análises mais finas. Inicialmente, separamos as regiões Centro, Portuária, Lagoa e Zona Sul, até o Leblon. Somando o estoque dessas áreas, existem 77 edifícios classe A, em 1,18 milhões de metros quadrados, com 38% de taxa de vacância. Deste montante, registramos 9 edifícios multiusuários que estão 100% locados, 15 monousuários (ou prédios públicos) 100% locados e 13 edifícios 100% vagos. Esses números são referentes somente ao estoque classe A. Se dos 77 ativos 24 estão 100% ocupados, restam 53 que possuem vacância, e isso gera concorrência. Quando separamos os empreendimentos multiusuários, temos mais torres 100% vagas do que 100% locadas, o que indica a necessidade de controle de novo estoque.

Mesmo com essa situação, a cidade foi foco de algumas transações importantes e que mostram uma evolução em relação à quantidade de metros quadrados locados. Nos períodos anteriores, tínhamos transações de destaque com 5 ou 6 mil metros quadrados, mas já começamos a ver mudanças também neste sentido, como os 18 mil metros quadrados locados pela Furnas no Barão da Mauá, os 14 mil metros quadrados locados pela Enel Brasil no AQWA Corporate e os 14 mil metros quadrados locados pela Stone Pagamentos no eio Corporate. Além dessas, podemos citar, ainda, os 3.400 metros quadrados da Your Studio também no AQWA Corporate e os 5.600 metros quadrados da Souza Cruz no Ventura Corporate, sem mencionar a compra de 20.900 metros quadrados do Porto Atlântico pelo Bradesco. Ou seja, temos, sim, grades transações. Ainda assim, não estamos vendo grandes movimentações de flight to quality, o que gera certa dúvida em relação à efetividade da queda de preços, que já é uma realidade na cidade. Isso se dá ao fato de ainda existir certa insegurança em relação ao desenvolvimento econômico do mercado carioca, sobretudo no setor de óleo e gás. Os responsáveis pelas empresas visitam os empreendimentos e gostam do lugar e do preço, mas não querem contratos um pouco mais duradouros, de cinco anos, por exemplo. Contudo, para 2020, a tendência é que essa insegurança diminua e que exista um aumento na absorção.

Mercado paulistano

No mercado de São Paulo, a situação é outra: considerando todas as classes, a cidade possui 14,1% de taxa de vacância (número referente ao quarto trimestre de 20190, sendo que o número cai para cerca de 10% quando consideramos apenas as regiões primárias. Falando somente sobre classe A, são 13,8% na cidade inteira e cerca de 8% nas regiões primárias. Além da queda rápida nas taxas de vacância, notamos que os espaços vagos em empreendimentos classe B e C também estão sendo absorvidos.

Uma breve análise desses números nos leva a entender outra informação importante: o mercado classe A das regiões primárias possui 240 mil metros quadrados de vacância nominal. Se considerarmos que nos últimos quatro trimestres a absorção líquida desse grupo foi de 191 mil metros quadrados e projetarmos algo similar para 2020, chegamos a 1,6% de taxa de vacância, com vacância nominal perto dos 50 mil metros quadrados, considerando o aumento proporcional do estoque. Obviamente, trata-se de uma análise “fria” e que não considera alguns fatores que devem dar conta de evitar essa queda para um patamar tão baixo.

Primeiramente, como um movimento normal do balanço entre oferta e demanda, temos os preços de aluguel, que já subiram e vão continuar a subir. Esse aumento, do meu ponto de vista, representa a cobrança do preço que as locações realmente valem. Veja: durante os períodos de crise, com alta vacância, os 24 proprietários reduziram preços, aumentaram carências e proporcionaram cash allowance. Com isso, tivemos mais absorção. Contudo, chegou o momento de fazer valer o que os empreendimentos realmente valem. Isso já está acontecendo e é algo que vai marcar o ano de 2020.

Outro fator que deve “segurar” essa queda brusca na taxa de vacância é a atividade construtiva. Em 2012, tivemos quase 2 milhões de metros quadrados de espaços em construção e isso impactou no aumento na taxa de vacância. Em 2018, tivemos uma queda desse número para valores bem mais baixos, perto de 400 mil metros quadrados. Em 2019, notamos um crescimento nesse número, que chegou a 606 mil metros quadrados na pesquisa mais recente da Buildings. Ainda que existam as restrições do Plano Diretor da cidade, existe uma tendência de que esse movimento continue.

Além das entregas de 2019, as previsão de entregas para 2020 incluem o RiverView (retrofit do antigo Nestlé Building, com 43 mil metros quadrados), o safra Frei Caneca (11.500 metros quadrados), o Birmann 32 (50 mil metros quadrados) e as duas torres do Parque da Cidade que somam quase 70 mil metros quadrados, com previsão já para o começo do ano.

O desafio das empresas

As entregas do final de 2019 ao longo do ano de 2020 vão, obviamente, inserir mais espaço disponível no mercado classe A da cidade de São Paulo, mas é preciso entender que uma parte desse total já está pré-locada. É necessário prever, também, a chegada de novas empresas que podem entrar no mercado e ocupar metragens consideráveis, algo que é real e que vem acontecendo, conforme estudo que fizemos e que já foram apresentados, inclusive, na nossa revista nas edições anteriores do Buildings Exclusive.

Com isso, constatamos que o desafio de encontrar espaços, que já existe, deve ficar ainda mais evidente em 2020. Veja a Tabela 1, que demostra a disponibilidade de áreas nas regiões primárias. Com tal situação, fica claro que as listas de opções de ocupação para as empresas devem ser reduzidas ainda mais. Em alguns casos, como na faixa de 2 mil a mais de 10 mil metros quadrados na Vila Olímpia, simplesmente não existem opções.

É interessante, ainda, dizer que chegamos neste ponto já com um aumento nos preços transacionados. De 2018 para o último trimestre de 2019, observamos aumento nos valores praticados nessas mesmas regiões: 12% na Berrini, 11% na Chucri Zaidan, 38% na Paulista e 25% na Vila Olímpia. Na Faria Lima, não foi registrado aumento, já que em 2018 os empreendimentos da região já estavam com preços condizentes com o teto.

A partir deste ponto da nossa análise, conseguimos traçar algumas perspectivas. A primeira delas tem a ver com o perfil de muitas empresas modernas, que buscam, além de localização, um local com identidade própria bem clara e que “converse” com a equipe. Considerando esse perfil e a falta de espaços, podemos ver a consolidação de imóveis customizados, como acontece com Mercado Livre e iFood, por exemplo.

Como outra alternativa, temos a continuidade e a potencialização dos movimentos de retrofit. E isso não está, de forma alguma, apenas no plano das ideias. Na lista dos retrofits concluídos ou em processo em 2019, temos o Berrini 500, o Pinheiros Corporate, o Complexo Centenário, o OF 585, o Paulo de Tarso Montenegro e o CalCanter I. Já na lista de empreendimentos a serem retrofitados, temos o Centeco Plaza, o Nestlé Building, o WTC e o Condomínio São Luiz. Além de todos esses, entendo que grande estoque da cidade de São Paulo abre a possibilidade para a revitalização de outras torres, como O CEF – Eugênio Lima, o Nassib Mofarrej, o Rachib Saliba e o Brasílio Machado Neto. São empreendimentos que têm potencial, sobretudo por causa da qualidade e de suas localizações.

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